O Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu na quarta-feira(26/02/25) que a industrialização por encomenda não está sujeita à cobrança do Imposto Sobre Serviços (ISS). A decisão foi por ampla maioria (10 votos a 1),seguindo o voto do relator, ministro Dias Toffoli. No entanto, por 8 votos a 3,o tribunal estabeleceu que os efeitos da decisão valerão a partir da publicação da ata do julgamento. Além disso, contribuintes que não contestaram a cobrança no Judiciário não poderão solicitar a restituição dos valores já pagos.
O caso analisado no Recurso Extraordinário – RE nº 882461 envolve uma disputa entre a empresa Arcelor Mittal e o município de Contagem (MG). A controvérsia gira em torno da atividade de corte de chapas de aço destinadas à construção civil, com a dúvida sobre se essa etapa deve ser classificada como industrialização (tributada pelo ICMS) ou prestação de serviço (sujeita ao ISS). A empresa argumentou que a atividade faz parte da cadeia produtiva industrial, enquanto o município sustentou que se trata de um serviço tributável pelo ISS.
O ministro Toffoli afirmou que a Lei Complementar nº 116/03, ao não excluir expressamente bens destinados à industrialização ou comercialização, distorceu o escopo do ISS e invadiu a competência da União. Ele ressaltou que a base de cálculo desse imposto é o valor do serviço prestado.
O STF fixou a seguinte tese: “É inconstitucional a incidência do ISS sobre atividades descritas no subitem 14.5 da Lista anexa à LC 116/03quando o objeto for destinado à industrialização ou comercialização”. Esse item inclui atividades como corte, beneficiamento, pintura e outros processos similares.
Para os contribuintes, a decisão traz mais segurança jurídica, pois elimina a bitributação entre ISS e ICMS.
O único voto contrário foi do ministro Alexandre de Moraes, que defendeu a manutenção da tributação pelo ISS, apoiando decisão anterior do Tribunal de Justiça de Minas Gerais (TJMG). O TJMG havia considerado que os serviços prestados eram a atividade principal da empresa e, portanto, sujeitos ao ISS.
Além da questão do ISS, Toffoli também determinou que a multa demora não pode ultrapassar 20%, um entendimento seguido pela maioria dos ministros, exceto Moraes. No entanto, Moraes argumentou que, no caso específico de Contagem, a multa aplicada foi de caráter punitivo (30%), e não moratório, sendo que o STF já fixou o teto para multas punitivas em 100%.
No que diz respeito à modulação dos efeitos da decisão, o STF estabeleceu que a não incidência do ISS sobre industrialização por encomenda valerá apenas para o futuro, impedindo a restituição de valores já pagos, salvo nos casos de bitributação, onde poderá ser solicitado o reembolso do ISS. Além disso, as empresas não poderão ser cobradas retroativamente por ICMS ou IPI.
Por fim, os ministros Luiz Fux e Luís Roberto Barroso inicialmente haviam feito ressalvas ao trecho da modulação, mas acabaram acompanhando o voto de Toffoli na íntegra. Os ministros Alexandre de Moraes, Cristiano Zanin e Gilmar Mendes, no entanto, discordaram da modulação. Gilmar Mendes questionou a inclusão do IPI na tese, alegando que esse imposto não havia sido objeto de controvérsia na ação. A Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional (PGFN) deve apresentar embargos para contestar essa interpretação.
Celebra-se o julgado, pois ao definir que a industrialização por encomenda não está sujeita ao ISS, evita-se a bitributação e garante-se a incidência correta do ICMS, um imposto que gera créditos ao longo da cadeia produtiva. Diferente do ISS, que é um tributo cumulativo e não permite a apropriação de créditos, o ICMS possibilita a compensação do imposto pago nas etapas anteriores, reduzindo o impacto tributário para as empresas e evitando distorções no custo dos produtos.
Fonte: Fecomercio-SP
Seguem abaixo as considerações dos advogados do escritório Leite Martinho Advogados, assessores jurídicos da ANDAP e do SICAP
Essa discussão ficou bastante tempo em polêmica. Os Municípios estavam cobrando ISS quando identificavam a operação e o Estado cobrava ICMS.
Até 2021 o STJ manteve o entendimento de que deveria incidir ISS na operação. Após 2021 modificou-se o entendimento para ICMS, ao argumento de que a industrialização por encomenda seria uma “etapa” da cadeia produtiva e deveria incidir ICMS, com direito a crédito e débito.
O STF, na última decisão, apenas confirmou o que estava sendo majoritariamente sustentado nos Tribunais após 2021.
Especificamente nas operações que envolvam marca própria e manuseio de importados (especialmente nas atividades de montagem de kits, embalagem e reembalagem), a decisão tem plena aplicação para afastar o ISS. Explico.
Muitas empresas que trabalham com marca própria ou manuseio de produtos importados (como montagem de kits, fracionamento, etiquetagem e embalagem) estavam sujeitas à cobrança do ISS pelos municípios, que classificavam essas atividades como serviços tributáveis conforme a Lista da LC 116/03, item 14.05.
Com a nova decisão do STF, essas atividades podem deixar de ser tributadas pelo ISS, desde que estejam inseridas na cadeia produtiva industrial e os bens sejam destinados à comercialização ou nova industrialização.
Pontos relevantes da discussão:
• Montagem de kit.
• Fracionamento e reembalagem de produtos importados.
• Etiquetagem, codificação e aplicação de selos.
• Acondicionamento para distribuição.
Se essas operações forem entendidas como parte da industrialização e não como um serviço isolado, a tributação passará a ser pelo ICMS, que permite o crédito ao longo da cadeia produtiva, reduzindo a carga tributária.
O que ainda pode der tributado pelo ISS?
Apesar da decisão do STF, algumas atividades podem continuar sujeitas ao ISS se forem entendidas como serviços independentes e não como parte do processo produtivo:
A) Logística e armazenagem: Se a empresa apenas armazena, separa e distribui sem realizar um processo de transformação, pode continuar sendo tributada pelo ISS.
B) Personalização de produtos: Gravação de logotipos, customização de embalagens sem fins industriais pode ser considerada um serviço.
C) Serviços sob encomenda para consumidor final: Se a montagem ou embalagem for feita diretamente para o consumidor final, pode se encaixar como prestação de serviço tributável.
Cuidados
A) Revisão de contratos e enquadramento fiscal: Empresas que ainda pagam ISS sobre essas operações devem revisar sua tributação e, se necessário, buscar um planejamento tributário para alinhar-se à nova jurisprudência.
B) Risco de questionamento pelos municípios: Alguns fiscos municipais podem tentar manter a tributação, alegando que as operações não se enquadram na decisão do STF. O correto é demonstrar que a atividade faz parte da cadeia produtiva industrial.
C) Interpretação dos estados sobreo ICMS: Como o ISS foi afastado, os estados podem intensificar a cobrança do ICMS sobre essas operações.
Considerações elaboradas por: Leite Martinho Advogados –lma.com.br